O fogareiro

Estórias de um motorista de táxi de Lisboa

30.4.07

Cais do Sodré

Cais do Sodré, o «abono de família» dos taxistas, costumo eu dizer. É chegar e «carregar», assim que chega barco ou comboio. Vou lá várias vezes ao dia, com a particularidade de ser um local arejado em dias de muito calor e onde se pode beber água fresca. Há dias li um artigo de José António Saraiva, director do semanário «SOL», a propósito do Cais do Sodré. Não resisto a transcrevê-lo neste «cantinho». Só foi pena que não se tivesse lembrado do sr. Hermínio, o proprietário do quiosque onde se comem os melhores torresmos :) de Lisboa... Há 39 anos!

O Cais do Sodré é a única praça de Lisboa onde se pode tomar qualquer meio de transporte. Com excepção do avião, claro. De lá já não partem caravelas para a Índia, como há cinco séculos, mas partem cacilheiros para a outra banda. Não saem comboios para o estrangeiro, como em Santa Apolónia, mas saem composições para Cascais. E também lá existe um terminal do Metropolitano. E lá se cruzam, num emaranhado por vezes caótico, carros eléctricos, autocarros e automóveis.
O Cais do Sodré assemelha-se a uma babilónia. Além do trânsito constante, há gente a correr em direcção à estação ferroviária para apanhar o comboio para a Linha e filas de pessoas, quais carreiros de formigas, caminhando em passo acelerado para não perder o barco. Noutra zona da praça misturam-se os que tomam o velho eléctrico com os que estão à espera do autocarro, para não falar dos que se atropelam para apanhar um táxi, que muitas vezes está ocupado. E em baixo, nos subterrâneos, movimenta-se uma mole humana que chega ou parte de Metro. Não é vulgar encontrar, mesmo procurando pelo mundo fora, um largo servido por todos os meios de transporte. Mas curiosamente, apesar de já ter por lá passado milhares de vezes, só há dias me dei conta disso.
A minha relação com o Cais do Sodré é antiga. Para quem nasceu em Lisboa, a ida às compras ao Chiado comportava normalmente uma paragem no Cais do Sodré. Chegava-se aqui de eléctrico, de autocarro ou de comboio, apanhava-se outro eléctrico que subia a Rua do Alecrim e saía-se na Praça de Luís de Camões – contígua ao Chiado.Mas outros factos estreitaram a minha relação com o Cais do Sodré. A minha mãe foi professora no Instituto Comercial de Lisboa, que ficava na Rua das Chagas, uns cem metros distante da dita Praça de Camões. E embora ela normalmente usasse o ascensor da Bica, que sobe do Conde Barão para o Calhariz, muitas vezes ia ou vinha pela Rua do Alecrim e pelo Cais do Sodré. E como eu de vez em quando a acompanhava, palmilhava estes lugares.
Noutra altura da vida, já estudante universitário, também andei por ali. O curso de Arquitectura, na época, estava integrado em Belas-Artes, onde igualmente se ensinava Pintura e Escultura – e a Escola de Belas-Artes de Lisboa era no Largo da Biblioteca Pública, ao fundo da Rua Ivens. Como morava em Belém, eu ia e vinha de eléctrico, usando a paragem do Largo do Corpo Santo – que fica a dois passos do Cais do Sodré, onde nos dias em que havia disponibilidade e o tempo estava bom dávamos uma volta antes de ir para casa. E quando o rei fazia anos comíamos no Porto de Abrigo, hoje agonizante.
Recentemente, a minha relação com o Cais do Sodré reacendeu-se outra vez. Diariamente, quando vou para o SOL, contorno a praça para entrar na Rua do Alecrim – que subo depois a caminho do parque onde estaciono o carro.
O Cais do Sodré pode dizer-se que é uma espécie de apêndice do Terreiro do Paço, um parente pobre do grande «anfiteatro de Lisboa», uma praça secundária localizada numa zona da cidade já quase periférica, longe das boas lojas e dos sítios da moda. Mas basta uma observação mais atenta para percebermos que ali palpitava o coração do Império. Por ali passava tudo. Acompanhe-me numa visita ao local.Saindo do Cais do Sodré a caminho da Praça do Comércio, pela rua junto ao rio, temos à esquerda o velho Arsenal da Marinha, que antes do terramoto era a Ribeira das Naus – onde se construíam as caravelas que protagonizaram os Descobrimentos. Por trás, fica a Rua do Arsenal. É hoje ocupada por uma fila contínua de estabelecimentos onde se vende o quê? Está à vista: bacalhau salgado ou seco, caras de bacalhau, línguas de bacalhau e outras conservas, como as ovas de sardinha. É formidável como este comércio resistiu ao tempo! Porque é o mesmo que há séculos fornecia as caravelas, enchendo-lhes os porões com o peixe salgado metido em barricas.
Vale a pena passar por ali e sentir o cheiro – que a uma primeira impressão pode parecer pestilento, nauseabundo, mas que depressa se percebe estar impregnado de significado e de História. E enquanto se saboreia o cheiro admire-se o espectáculo das toneladas de salgados expostas nas prateleiras, penduradas no tecto ou acamadas em sacas de serapilheira.Nas traseiras do Cais do Sodré ficam os bares. Alguns de má fama, onde se bebe, se dança e se contratam prostitutas. Não é difícil, também, adivinhar o passado daquela zona: era ali que os marinheiros de antigamente matavam a sede e a fome de mulheres. Também o comércio aqui resistiu estoicamente ao tempo.
Quando ainda trabalhava em arquitectura, colaborou comigo um desenhador que fizera a tropa em África, onde tivera várias mulheres que lhe garantiam uma vida regalada – uma vida que ele não poderia levar com o miserável «pré» de furriel. Veio para cá e retomou a profissão que tinha antes de partir: desenhador de arquitectura.
Era uma excelente pessoa. Leal, amigo do seu amigo, trabalhador. Mas ganhara hábitos difíceis de sustentar com o ordenado de desenhador. E também vícios. De manhã, quando ia para o emprego, encontrava muitas vezes no autocarro uma loura que conhecia vagamente do bairro onde ambos habitavam. Meteu conversa. A mulher era casada e o marido estava na situação em que ele estivera até há pouco: cumpria a tropa em África. O tipo não tardou a tirar partido da situação. A loura era um traço de mulher: alta, esbelta, bem equipada, cabeleira abundante e rosto de actriz italiana nascida no Norte. Valia o seu peso em ouro. O desenhador gostou dela, ganharam intimidade – e conversa puxa conversa o nosso homem explicou-lhe que o que ela ganhava não chegava para nada e convenceu-a a trocar o emprego que tinha num consultório médico pelos bares do Cais do Sodré. Por outras palavras, «pô-la a render».Foram felizes à maneira deles. Gostavam verdadeiramente um do outro. Achavam natural aquela forma de vida: ela consideraria um desperdício não tirar partido do corpo com que o Senhor a contemplara para melhorar a vida, ele dava-lhe amor e protecção e achava natural que ela lhe retribuísse. Chamei-lhe várias vezes a atenção para a imoralidade da situação. Mas ele respondia-me com ar cândido:
– Ela recebe dinheiro por dar prazer a outros homens e por isso considera normal pagar-me a mim porque lhe dou prazer.
Mas acrescentava, com orgulho, que era o único «chulo» do Cais que tinha profissão. Por isso, não se considerava igual aos outros. Achava-se de outra estirpe. E com razão: nunca falhou quando precisei dele. Se fosse preciso, estava disponível para trabalhar à noite, sendo mesmo o primeiro a chegar.Estive anos sem saber dele. Um dia encontrei-o nas Amoreiras. Estava mais ou menos na mesma, só um bocadinho mais gordo. Perguntei-lhe pela rapariga.
– Ela morreu... Já não estava comigo – respondeu com o ar cândido que não perdera.
E adiantou:
– Meteu-se na droga e morreu com uma overdose.Cais do Sodré – onde confluem barcos, comboios, autocarros, eléctricos, táxis e até o Metropolitano.Nas imediações permanecem as lojas de salgados que outrora aprovisionavam as naus e agora abastecem os restaurantes da Baixa. Atrás, nas ruelas escuras, escondem-se os bares onde os marinheiros matavam antigamente a fome e a sede – e onde hoje mata a mesma fome e a mesma sede gente perdida vinda de vários locais da capital.O Cais do Sodré – ou simplesmente o Cais, para os habitués – é uma praça já quase periférica de uma cidade que evoluiu noutro sentido. Mas conserva nas imediações todos os sinais que a colocaram no centro do Império. E os meios de transporte que nela desaguam dão-lhe uma importância especial, levando a que se possa dizer, com propriedade, que «todos os caminhos vão dar ao Cais».

José António Saraiva

27.4.07

Brasil: «ameo» ou «deicheo»

Não me canso de ler, há largos anos, as crónicas de Duda Guennes, em «A Bola» e não só... Aqui reproduzo mais uma, com a devida vénia:

Esta hebdomadária coluna está sempre a receber novidades do Brasil. Esta é uma relação actualizada das pérolas estudantis escritas nas provas do Exame Nacional do Ensino Médio. Transcrevo-as, respeitando a grafia original:
«O seromano tem uma missão»;
«O Euninho já provocou secas e enchentes calamitosas»;
«O problema ainda é maior se tratando da camada Diozanio»;
«Enquanto isso os Zoutros... tudo baixo niveu»;
«A situação tende a piorar: os madeireiros da Amazónia destroem a Mata Atlântica da região»;
«O que é de interesse colectivo de todos nem sempre interessa a ninguém individualmente»;
«Não preserva apenas o meio ambiente e sim todo ele»;
«O grande problema do Rio Amazonas é a pesca dos peixes»;
«É um problema de muita gravidez»;
«A AIDS é transmitida pelo mosquito AIDES EGIPSIO»;
«Já está muito de difícil de achar os pandas na Amazónia»;
«A natureza brasileira tem 500 anos e já esta quase se acabando»;
«O cerumano no mesmo tempo que constrói, também destrói, pois nós temos que nos unir para realizarmos parcerias juntos»;
«Vamos mostrar que somos semelhantemente iguais uns aos outros»;
«Menos desmatamentos, mais florestas arborizadas»;
« [...] provocando assim o desolamento de grandes expécies raras»;
«Nesta terra ensiplantando tudo dá»;
«Isso tudo é devido ao raios ultraviolentos que recebemos todo dia»;
«Tudo isso colaborou com a estinção do micro-leão dourado»;
«Imaginem a bandeira do Brasil. O azul representa o céu, o verde representa as matas, e o amarelo o ouro. O ouro já foi roubado e as matas estão quase se info. No dia em que roubarem o céu, ficaremos sem bandeira»;
«Ultimamente não se fala em outro assunto anonser sobre as araras azuis que ficam sob voando as matas»;
«[...] são formados pelas bacias esferográficas»;
«Precisa-se começar uma reciclagem mental dos humanos, fazer uma verdadeira lavagem celebral em relação ao desmatamento, poluição e depredação de si próprio»;
«O seringueiro tira borracha das árvores, mas nunca derrubam as seringas»;
«Vamos deixar de sermos egoístas e pensarmos um pouco mais em nós mesmos».

Exame de geografia

Já que estamos falando de exames, tem aquela do professor que perguntou ao aluno quantas eram as partes do mundo. Para ajudá-lo, avançou que eram tantas como as vogais. Aí, o aluno respondeu que eram cinco.
— Quais são?
— A, E, I, O, U.
— Essas são as vogais, não são as partes do mundo. Vamos ver se se lembra. Começam também por A... Ásia...
— Já sei... Ásia, Ésia, Ísia, Ósia e Úsia.

Duda Guennes

26.4.07

Há tempos cruzei-me com Eusébio. O encontro aconteceu por acaso, porque temos um amigo comum. Comecei a gostar de futebol, em grande parte, por causa de Eusébio, Simões, José Augusto, Coluna, Torres... Tinha 15 anitos e lembro-me bem do célebre jogo com a Coreia do Norte, no Mundial de 1966, em Inglaterra. Vinha do aeroporto, no «carocha» de um funcionário da TAP (Ribatâmega de seu nome), onde fui buscar serviço dos enviados-especiais de «A BOLA» (Vítor Santos, Carlos Pinhão e Nuno Ferrari). Ouvíamos o relato e quando o «king» deu a volta ao jogo foi o delírio na Avenida da República, perto do Saldanha. Lisboa parou! Para um puto recém-chegado à cidade, oriundo de uma bonita mas recôndita aldeia beirã, aquilo foi o máximo...
Fui mordido pelo «bichinho» do futebol e depois assisti a inúmeros jogos do Benfica. Confesso que nunca vi alguém jogar como Eusébio. Bem sei que houve polémica na escolha do «melhor do século»; bem sei que temos Pelé, Maradona, Di Stefano, Puskas, Cruyff, Platini e tantos outros na galeria dos melhores. Tudo isso é verdade e discutível, mas ninguém conseguirá apagar da minha memória a magia de uma bola nos pés de Eusébio. Para mim, foi o maior. Assim como Pelé foi o maior para os brasileiros. E Maradona para os argentinos...
A conversa com Eusébio foi, para mim, uma espécie de «ajuste de contas» com o passado. Falámos de futebol e também de Vítor Santos, Carlos Pinhão, Nuno Ferrari... O «king» tem memória de elefante. Lembra-se de «estórias» fascinantes e conta-as naquele seu jeito calmo e sábio, à boa maneira de «seculo» africano.
Eusébio teve hoje alta do hospital, onde foi submetido a delicada intervenção cirúrgica. Não pertenço ao imenso rol de amigos do «king» (o nosso encontro foi ocasional...), mas gostaria de deixar aqui um voto de rápida recuperação àquele que foi um dos meus ídolos da juventude.

25.4.07


Abril de sim, Abril de não
Eu vi Abril por fora e Abril por dentro
vi o Abril que foi e Abril de agora
eu vi Abril em festa e Abril lamento
Abril como quem ri como quem chora.
Eu vi chorar Abril e Abril partir
vi o Abril de sim e Abril de não
Abril que já não é Abril por vir
e como tudo o mais contradição.
Vi o Abril que ganha e Abril que perde
Abril que foi Abril e o que não foi
eu vi Abril de ser e de não ser.
Abril de Abril vestido (Abril tão verde)
Abril de Abril despido (Abril que dói)
Abril já feito. E ainda por fazer.
Manuel Alegre

24.4.07

Já aqui falei da necessidade que algumas pessoas sentem de desabafar. Julgo que sou um taxista com bom ar (passe a imodéstia...) e, assim sendo, basta um clique para despoletar uma conversa no interior do carro. Falo com gente de várias condições sociais e culturais e essa é a parte mais gratificante desta vidinha de «fogareiro». Sou incapaz de forçar o diálogo no sentido de saber algo mais do cliente – algumas pessoas é que precisam de comunicar!
M. é mulher com bom aspecto, à volta dos 50 anos. Transporto-a a uma clínica da zona de Entrecampos, onde faz tratamento. Conta-me que foi «apanhada» pelo bichinho do tabaco. Tento confortá-la, dizendo-lhe que a vida está cheia de armadilhas, e cito-lhe de cor uma parte de um poema cantado pela Maria Bethânia («tocando em frente»), de que gosto muito. M. sorri na despedida – um sorriso bonito –, mas deixa escapar: «Sabe o que vai custar-me mais? Começar a fazer quimioterapia!»

21.4.07

Praça 5 de Outubro – É homem na casa dos 50 anos. Transporta uma mala e pede-me para fumar um cigarro. Está esbaforido, o rosto com arranhões – nota-se que não está bem! Sugiro-lhe que se acalme. Às tantas começa a desabafar... Chora! Precisa de guarida e vai ao encontro de pessoa amiga, em Campo de Ourique. Saiu de casa zangado com a companheira e jura que não volta mais. Coisas da vida!

Estação de Santa Apolónia – A mulher, ainda jovem, vem acompanhada de uma criança. Pede-me para transportá-la a uma residencial do Poço do Borratém, zona de prostituição, mesmo durante o dia, bem próxima do Martim Moniz.
Acho estranho, aquela mãe jovem alojar-se com a criança numa pensão vocacionada para receber clientes que se dedicam à prostituição. Nada lhe digo durante a curta viagem, mas chegados ao local, como quem não quer a coisa, pergunto-lhe como veio ela parar àquele local. «Através da Internet», justifica com pronúncia do Norte.
Ainda me prontifico a transportá-la a outro local, mais higienizado, mas ela encolhe os ombros e... dirige-se à recepção.

16.4.07

Nesta «triste tristeza lusitana», em que o diploma do primeiro-ministro é o acontecimento mediático mais importante, sem falar do Benfica, que só nos dá desgostos, sabe bem conversar com alguém que nos vê com outros olhos.
Foi o meu caso, hoje, ao transportar a norueguesa Vigdis Augusta (ascendente latino). Decoradora, vive há quatro anos em Portugal e não pensa regressar em definitivo ao seu país de origem. Apaixonou-se pela luz de Lisboa (e não só...), já fala um português razoável e... até canta o fado!
Vigdis abriu uma casa de fado vadio bem no coração de Alfama (na Rua de São Miguel), chamada A Baiúca. Estou convidado para um copo e tenho curiosidade em ver uma norueguesa a cantar o fado...

Estação de Santa Apolónia (comboio do Entroncamento) – É homem de 30 e poucos anos, vem sozinho e sem bagagem. «Leve-me à Meia-Laranja!» Senta-se à frente, a meu lado, e quando tal acontece já sei que se trata de cliente disposto à conversa. Traz consigo o jornal «Correio da Manhã», cuja capa relata a prisão de três dos suspeitos de homicídio da funcionária de uma bomba de combustível em Benavente. E a conversa começa por aí...
Condena a atitude «bárbara» dos assaltantes: «São estúpidos! Confrontados com a presença súbita da GNR, só tinham de disparar para os pneus do jipe e pôr-se em fuga... Matar não!»
Ganha a confiança do taxista e... desabafa. Vem «matar saudades» do Casal Ventoso... Passou largos anos na prisão, condenado por assaltos a residências. «Mas nunca matei; seria incapaz!», faz questão de sublinhar.
Hoje trabalha numa fábrica, mas a adaptação à liberdade não está a ser fácil. «Saímos da prisão e fecham-se-nos todas as portas, a nível social e profissional. Consegui este trabalho, mas ganho uma miséria. De vez em quando ainda tenho necessidade de arranjar uns trocos para vir aqui à Meia-Laranja. Mas não quero voltar lá para dentro...»
Um dia, estava a assaltar uma vivenda e foi surpreendido com a entrada da proprietária, que regressou a casa para levar algo de que se tinha esquecido. Escondeu-se, manteve-se calmo e depois fez o que tinha de fazer. «Muitos ficariam nervosos e fariam coisas despropositadas...»
Meia-Laranja. Mal chegou, o meu cliente foi de imediato abordado por vários dealers. Negoceia-se às claras... Sei lá o quê?!

15.4.07

Memórias de Um Chauffeur de Táxi

Reinaldo Ferreira, o famoso Repórter X, é indubitavelmente o primeiro escritor policial português digno desse nome. Além das «reportagens sensacionais» que o celebrizaram, muitas são as suas obras de cariz detectivesco dispersas por jornais e magazines ou publicadas em brochuras.
Quase todas elas estão, hoje em dia, injustamente esquecidas. Prestando homenagem ao talentoso e imaginativo criador do Dr. Duque, o cartomante do raciocínio, de Kiá, do major Calafaia e de tantos outros rivais lusitanos de Sherlock Holmes e de Nero Wolfe, a Colecção Vampiro – para comemorar condignamente o seu n.º 700 e o início do seu 60.º ano de existência – apresenta ao leitor as Memórias do Juca, pitoresco taxista alfacinha que, neste livro, narra os casos mais extraordinários e intrigantes com que entrou em contacto, primeiro por acaso do ofício e, depois, como interventor sagaz e empenhado.
É toda a Lisboa dos loucos anos 20 que perpassa pela obra, com os seus clubes nocturnos, os seus cavalheiros de indústria, os seus mistérios, os seus escândalos. Profundo conhecedor da cidade, Juca sempre que fareja o Insólito, não descansa enquanto não desenreda a meada, com uma astúcia e uma desenvoltura que fariam inveja a muito detective lá de fora, criado pelos grandes cultores do género e popularizado em todo o mundo.
Em complemento, o leitor será transportado à Ilha dos Ladrões para assistir a um Congresso de Alta Gatunagem internacional, em que Reinaldo Ferreira faz intervir Fantômas, Raffles, Arsène Lupin e outros ilustres «amigos do alheio» – entre os quais o também lisboeta «Fresquinho», que de forma elucidativa ensina aos colegas o que é o muito nosso «conto do vigário».

Editor: Livros do Brasil
Colecção: Vampiro

3.4.07

Lisboa a meio-gás nesta semana da Páscoa. Valham-nos os espanhóis, que estão a «invadir» a capital portuguesa e não só... As «coisas» estão a melhorar em termos de turismo, depois de primeiro trimestre fraquinho, como sempre acontece, dizem os mais velhos.
Hoje, nos Jerónimos, «carreguei» um casal estrangeiro (ele mexicano, ela brasileira). Estavam em trânsito para Espanha, não tinham muito tempo e optaram por uma viagem de táxi à capital e arredores. Coube-me transportá-los ao Cristo Rei, depois de ontem terem visitado Sintra.
São pouco conversadores, mesmo entre eles. Limitam-se a frases curtas, de circunstância. Quando o diálogo não flui, fecho-me no meu «cockpit» e... siga a viagem. Às tantas, quando desço do Cristo Rei para Almada, ele surpreende-me com uma pergunta: «Em Portugal há poucos niños? Não se vêem niños nas ruas... No México, as ruas estão cheias de niños...»
Respondi-lhe que estamos em tempo de férias escolares, mas o mexicano não pareceu muito convencido. Será que os portugueses já esqueceram a fórmula como se fazem os niños?