O fogareiro

Estórias de um motorista de táxi de Lisboa

13.1.06

O «dorme-dorme»

Hoje vou falar do «dorme-dorme», cujo nome verdadeiro é João. Tem essa alcunha devido a uma doença rara de nome complicado, que faz com que ele adormeça profundamente com muita facilidade. O bom do João é um óptimo rapaz, sempre pronto a ajudar o próximo e com um coração do tamanho do mundo. Por isso é uma figura carismática na praça de Lisboa. É viúvo e vive sozinho, os colegas são a sua família.
Nunca adormece a conduzir, mas basta parar num semáforo mais prolongado para cair num sono pesado e depois é um problema para o acordar. Várias são as vezes que os clientes saem do carro e ali fica o pobre parado até que um de nós o acorde a muito custo. Felizmente, tem consciência da doença, por isso tem sempre o cuidado de puxar o travão de mão. Pórem, quando desperta, não são raras as vezes que julga ter ainda os clientes no táxi e lá vai ele para o destino.
Quando está nas praças, é certo e sabido que adormece. Sabedores disso, fazemo-lhe imensas judiarias, tais como tapar-lhe todos os vidros com jornais, deslocar-lhe o carro para um sítio diferente de onde estava, levantar-lhe a transmissão com um macaco hidráulico para que o carro ao arrancar não saia do sítio...
Uma vez, metemos-lhe um cão vadio no assento traseiro. Depois de o acordar, dissemos-lhe que tinha um cliente no carro e que queria ir para o Restelo. Ele lá arrancou, satisfeito da vida. Passados alguns minutos, voltou ainda com o canino...
– Vejam só! O cliente fugiu e ainda por cima abandonou o cão no táxi. E agora? O que faço?
Gargalhada geral, como devem calcular... Quem ficou a ganhar foi o cão... O meu amigo adoptou-o!
É assim o «dorme-dorme»! Bom homem e sempre disposto para a brincadeira

(Com a devida vénia, aqui transcrevo esta «estória» deliciosa retirada do blog «Crónicas de um motorista de táxi», que descobri recentemente.)