O fogareiro

Estórias de um motorista de táxi de Lisboa

17.9.06

Não dispenso o «Livro Aberto», programa de Francisco José Viegas, na RTPN. Hoje, o convidado foi José Eduardo Agualusa. Uma conversa muito interessante que me prendeu ao televisor do princípio ao fim, tanto mais que li alguns dos seus livros.
No final do programa li (na Internet) uma entrevista de Agualusa ao jornal «Época», na qual fala de António Lobo Antunes e José Saramago, da melancolia portuguesa e de muito mais... Não resisto a transcrever, com a devida vénia, duas passagens dessa entrevista:

ÉPOCA - E os autores portugueses?
Agualusa - São todos terrivelmente melancólicos. Não há personagem de autor português que não se suicide no final. Os portugueses parecem alguns autores paulistas actuais, soturnos e pessimistas. E há aqueles que não escondem a nostalgia do império e inventam um herói, sempre português, que percorre a África e a América, em geral povoadas por coadjuvantes sem importância. Ultimamente, porém, tenho lido autores jovens - Francisco José Viegas e Pedro Rosa Mendes - que já conseguem olhar para as antigas colónias com olhos menos colonialistas. O maior escritor lusitano da actualidade chama-se António Lobo Antunes. Ele é difícil na sua linguagem cheia de metáforas, é mesmo exagerado e sombrio, mas no meio de extensas zonas de sombra encontram-se golpes luminosos. Só que há poucos portugueses com humor depois de Eça de Queirós.

ÉPOCA - Por falar nisso, não citou o Nobel José Saramago. O que acha dele?
Agualusa - Ele pode ser um grande escritor. «Memorial do Convento» é um excelente romance. Mas não gosto dele. Saramago cultiva o niilismo. É um pessimista que não acredita na vida e os seus livros são contaminados pelo desencanto. É difícil escrever quando se descrê completamente da vida. Um grande romance deve ser feito com raciocínio, mas também com paixão, as vísceras e o coração. No seu último livro, «Ensaio sobre a Lucidez», Saramago faz a defesa do voto em branco, o que é ridículo, pois ele candidatou-se como deputado pelo Partido Comunista. José Saramago é vítima da própria descrença. É um velho.