O fogareiro

Estórias de um motorista de táxi de Lisboa

21.11.06

Aldeia das viúvas

Creio não ser novidade que as mulheres vivem mais tempo que os homens. Já li algo sobre o assunto, mas não me lembro onde e quando. Porém, se dúvidas tivesse, elas ficariam desfeitas ao visitar a bonita aldeia beirã de Monte do Trigo, no concelho de Proença-a-Nova. Só recentemente me apercebi de que grande percentagem dos habitantes, já de idade avançada, é formada por mulheres. Poderia apresentar uma estatística de toda a aldeia (é pequena), mas limitei-me a contabilizar a Rua da Sobreira: das dez casas lá existentes, sete são habitadas por viúvas. Esta realidade pode ainda ser confirmada no cemitério da aldeia – aos domingos, a percentagem de mulheres é muito maior que a dos homens.
Vultos negros vagueiam pelas ruas. Quando nos cruzamos, a conversa desagua quase sempre nos males de que padecem – os da alma e os outros. Recentemente, formaram uma pequena comunidade e rezam o «terço» ao fim da tarde. Depois, recolhem e não saem mais, porque o perigo de assaltos já não é exclusivo das grandes metrópoles.
[Gosto de visitar a aldeia, mas sou incapaz de viver lá muito tempo. Ao fim de uma semana, o lado urbano chama por mim. Mas faz-me bem respirar ar puro e dialogar com gente de outras vivências.]
As viúvas são pessoas tristes. Toda a vida amaram «aquele» homem e vivem das lembranças do passado. A religião católica é a sua âncora, mandam rezar muitas missas em memória dos falecidos.
Quando estou na aldeia, fico com a mente disponível para a reflexão. Não acredito em deuses, mas dão muito jeito... Que seria destas mulheres sem o seu deus protector?!